Por Padre Antonio Bogaz e prof. João Hansen
Todas as tardes, quando atravessamos o bairro para visitar a comunidade, encontramos com o Seu José Rodrigues, que carrega sua filha numa cadeira de rodas.
- Oi, Seu José, está levando a menina para passear ou e ela quem está passeando o senhor?
- Nem sei, mas pensando bem, sou eu quem está passeando.
Ele sorri timidamente e a menina parece alheia às conversas. Mas com certeza, está ouvindo e observando todas as palavras, os gestos e os comportamentos. Com certeza está percebendo. Temos que ter muito cuidado, sobretudo em hospitais, leitos de doentes, pessoas especiais, pois pensamos que as pessoas não estão compreendendo nada, mas podem estar acompanhando tudo o que se fala e todos os nossos gestos.
O que temos mesmo vontade é descer do carro e ajoelhar-se diante daquele pai, tão bondoso e tão querido. Cuida daquela filha como se cuida de uma florzinha frágil. Como uma florzinha delicada, que tem um perfume que nos enleva, aquela jovem filha deve ter um perfume maravilhoso que encanta aquele pai. Muitos podem não sentir, mas para ele, este sentimento dá razão para sua existência. É bom dizer o nome da menina. Nome bonito, ela se chama Daira. Nem tem tanta importância a origem de sua deficiência física. Correu para o hospital, a mulher grávida; sem seguro saúde. Até tinha, mas na hora do atendimento, falaram de uma tal carência. Não tinham falado na hora de contratar o seguro, mas estava escrito no contrato.
- Aquelas letrinhas pequeniníssimas, feitas para ler com lupa potente, que ninguém tem.
Correu para o Hospital Público, no meio da noite. Ele nem explicou, pois ficou emocionado. Um pouco emocionado e um pouco indignado. Sabia até o nome do médico, mas também não disse. Ficou na sua memória como um “palavrão”; portanto, não queria pronunciar seu nome. Apenas mostrou a menina e a acariciou. Ela sorriu. Aquilo bastava.
Hoje, anos depois, sua princesa está grande. Na verdade, pesa bastante. Mas que importa os quilos, é sua filha. Ficamos imaginando quão difícil é passear com a menina pelas ruas, até a praça. Hora vai pela calçada e quando depara-se com um buraco enorme vai para a rua, mesmo no perigo. Mas logo volta, para se desviar dos buracos do asfalto. Como seria bom se um dia, um dia pelo menos, os responsáveis pelas ruas da cidade, empurrassem uma cadeira de rodas pelas nossas ruas.
A menina é uma graça; quando sorri é como se acendesse o sol, numa manhã de neblina. Muitas vezes, é ela quem ilumina nossa esperança, em nossas manhãs cinzentas.
Num livreto do José Mauro de Vasconcelos, que se lia em nossos tempos escolares, O Palácio japonês, conta a história do Pedro, que é um menininho especial. Ele dá um trabalho enorme para seu pai, que até deixou sua carreira e organizou sua vida para cuidar do menino. Para que ser importante para o mundo, se não for importante para quem se ama? Um dia, o menino partiu e todos diziam:
- Foi melhor assim. Descansou. Agora o senhor, como pai, pode também descansar.
- Como foi melhor assim? Que tolice, santo Deus. E quem disse que eu quero descansar. Quero viver de tal modo, realizando tantas coisas boas, que eu possa descansar toda a eternidade.
Percebe-se que o pai, seu José, caminha cansado. Faz anos que passeia com sua princesa pelas nossas ruas. A menina está um pouco mais pesada, mas está mais sorridente ainda.
Quando vemos sua dificuldade e o carinho para empurrar a cadeira de rodas, comentamos:
- Meu Deus, como é pesado empurrar esta cadeira de rodas. E veja com que satisfação, o pai cumpre sua missão.
- Se é pesado fazer isso na estrada, como deve ser mais pesado ainda preparar a menina, arrumar suas roupas, fazer a higiene cotidiana. E a menina parece um brinco de tão reluzente.
Cada vez que vamos à comunidade, pedimos a Deus a graça de encontrar o nosso amigo; ou na estrada ou na praça e pedimos silenciosamente a Deus duas coisinhas.
Em primeiro lugar, que ele sobreviva a ela, senão, Cristo Deus, quem terá tamanho carinho. A segunda é mais delicada um pouco: queremos ficar sempre amigos do Seu José. Na porta do céu, espero muito que ele nos reconheça. Não fazemos quase nada por ele, mas lhe dispensamos sempre nossos gestos de admiração e de afeição. A missão é dele, mas ele sabe que pode sempre contar conosco. Ainda bem que a Daira tem este pai maravilhoso, acho que se ela entendesse o que significa este dia daria mais mil sorrisos do que dá, como se dissesse “feliz dia dos pais”.
Fonte: orionitas.com.br
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